sábado, 19 de julho de 2014

Narradores de Javé (Eliane Caffé, 2004)

Por Vitória Fonseca

Antônio Biá tem a função de escrever as histórias do povoado de Javé. Depois de ouvir várias pessoas, será que Biá consegue colocar as histórias no papel?
Na verdade, ele explica que é melhor que as histórias fiquem nas cabeças das pessoas, pois ele não consegue "dar razão" a elas no papel. Ou seja, ele não as escreve pois cada um conta a história de um jeito  e, para juntar tudo é preciso certa coerência, precisa de um sentido, um ponto de vista, enfim... Antônio Biá apenas consegue escrever aquilo que ele mesmo viu. Ou seja, aquilo que ele presenciou pode ganhar coerência na sua narrativa.

O que faltou para Antônio Biá? Comparando Antônio Biá a um historiador, faltaram os documentos que pudessem, minimamente "comprovar" os elementos das diversas narrativas, dos diferentes pontos de vista, das diferentes versões que cada personagem contava "puxando a sardinha" para o seu lado.

Cada personagem tem um ponto de vista e conta a história das origens de Javé de uma maneira. Podemos usar esses personagens como exemplos de maneiras diferentes de contar histórias sobre o passado:

Cena: Sr. Vicentino e Biá
Cena - Indalécio 
SENHOR VICENTINO: Narra a história do herói fundador Indalécio exaltando as suas qualidades e seus grandes feitos. Podemos dizer que é semelhante ao que chamamos de "história tradicional", na qual os personagens principais são grandes heróis (homens). Vamos lembrar que, no filme, Senhor Vicentino é supostamente um descendente de Indalécio.

Deodora e Biá
Cena: Maria Dina 
DEODORA: Narra a "mesma" história que o Senhor Vicentino, mas, ressaltando o importante papel de uma mulher, a Maria Dina, que, nessa versão da história, foi quem de fato fundou o povoado de Javé. Novamente é alguém que exalta as qualidades dos próprios antepassados.

Firmino e Biá
Cena: Maria Dina e Indalécio
FIRMINO: Firmino narra a história de Indalécio de um ponto de vista diferente dos dois anteriores mas focando na sátira ao personagem. Nessa versão, Indalécio morre em função de uma desinteria. Essa versão da história procura criticar a visão heróica dos antepassados. É uma narrativa semelhante àquela sobre a situação de d. Pedro I quando supostamente deu o "grito do Ipiranga".

Pai Cariá
Cena: Indaleo
PAI CARIÁ: Pai Cariá vive em um tipo de quilombo, com supostos 
descendentes de escravos que também possuem uma narrativa de fundação semelhante à que aparece Indalécio, com algumas modificações. Ou seja, um grupo de guerreiros, guiados por um líder valente, que foge de algum lugar e procura um lugar certo para morar. No entanto, nessa versão, os personagens são negros. Então, podemos associar essa narrativa à valorização da história do ponto de vista dos negros.

Gêmeo, Biá e Deodora
GÊMEO E O OUTRO: O personagem Gêmeo quer construir uma narrativa "oficial" que registre que apenas ele é herdeiro da propriedade dos seus pais. Ou seja, ele quer criar uma verdade e acredita que, a partir do momento que estiver registrada no papel, ele poderá usar como comprovação de que seu irmão não teria direito à herança por supostamente não ser "herdeiro legítimo".


Sua vez: Qual narrativa você faria sobre esses personagens?



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